Você fala ‘certo’ ou ‘errado’?

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Valdete de Andrade, funcionária da empresa que cuida dos serviços de limpeza da UFS, acha que não fala direito. “Eu não falo muito bem. Escrevo até bem, mas quando vou falar, falo errado. As letras também, eu engulo muitas letras”, diz.

No Brasil, país de dimensões continentais, o modo de falar das pessoas é diferente em cada região. Escolaridade, sexo, idade, raça e profissão são alguns dos fatores que contribuem para as diferenças linguísticas. O grau de intimidade com quem se fala também é fator determinante para a mudança no modo de se expressar. São essas diferenças o objeto de estudo da área de comhecimento denomidade sociolinguística.

“A sociolinguística não tem nenhuma preocupação com avaliações ou atitudes linguísticas, para dizer que a língua deve se realizar de uma maneira ou de outra. Ela tem uma visão de como uma língua funciona na sociedade”, explica o professor Antonio Ponciano Bezerra, do Departamento de Letras.

A noção de “errado” é, portanto, um termo evitado. Prefere-se adotar o conceito de “inadequado”, uma vez que em todos os idiomas existe uma variação na forma de se comunicar a depender do contexto. “Em todos os lugares há sempre situações de formalidade que exigem do falante um melhor tratamento nas palavras que se pronunciam, que difere daquele contexto onde há informalidade, onde existe um grau de intimidade com a pessoa com quem se fala”, afirma o professor.

Valdete, que está no segundo e último ano do ensino médio do Programa de Ensino de Jovens e Adultos (EJA), adequa-se a este perfil. “De acordo com o lugar que eu esteja tenho essa preocupação, fico querendo falar melhor. Na minha turma eu não me preocupo muito, porque nós todos falamos um pouquinho errado mesmo”.

GramáticaDerli Machado, também professor de Letras e autor do livro “O papagaio que desejava ser gente: um vôo pelo universo da linguagem”, explica que a sociolinguística “vai contemplar as variações e os diferentes aspectos da fala nos níveis sociais e geográficos, enquanto a gramática contempla a norma padrão da linguagem, tanto oral quanto escrita”.

Mais opiniões

No Brasil não há uma política linguística que considere as diferenças regionais e socioeconômicas para efeito de atividade didático-pedagógica. Quando abre-se um livro é comum haver apenas um capítulo tratando de variação lingüística e todo o resto agindo de acordo com a gramática tradicional.“Seria necessário os livros partirem do princípio de que a gramática é quem deve ser serva da língua, e não tratar o modo de falar das pessoas de forma imperativa, como é imposto pela gramática”, afirma Derli.

Ponciano acredita que a força da indústria editorial aliada ao descaso das políticas educacionais deixa de lado as diversas variações que ocorrem na língua. “Ninguém fala a forma padrão da língua, tida como forma culta, que é aquela exigida na gramática. Todos nós falamos formas desviantes, o que ocorre é que para algumas pessoas, devido ao preconceito existente, essas formas são tarjadas como erradas. Mas o importante é que sua forma de falar funcione perfeitamente no seu ambiente”, explica.

A discriminação linguística continua viva nas escolas brasileiras. É preciso encontrar instrumentos para combatê-la, uma vez que a língua é dinâmica, não está presa a normas. “Todo falante da língua materna fala bem sua língua, com variações. A linguagem é instrumento de interação social, de comunicação. Não deve ser usada para determinar status social”, diz Derli.

Por Juacy Junior

Nenhum comentário:

Postar um comentário

 
Contexto Online | by TNB ©2010