Gravidez Precoce: um diagnóstico-problema

quinta-feira, 21 de julho de 2011


A gravidez na adolescência está longe de se tornar um problema resolvido. No ano passado, o último relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para Infância (UNICEF) constatou que 20% das mães brasileiras são jovens de 12 a 17 anos e 48,5% dos adolescentes com vida sexual ativa não usam preservativo ou não usam sempre. Em Sergipe, a realidade não é diferente e as consequências tornam-se evidentes.
Gravidez precoce ainda é uma realidade no Brasil (Foto: Divulgação)
“Às vezes eu me prevenia, porém na hora a gente esquece. No geral, eu não usava camisinha, menos ainda anticoncepcional. Fiquei grávida com 17 anos do meu quarto namorado, eu namoro desde os 12 anos”, conta L. M., 18 anos. L. M. é apenas um de vários casos de gravidez precoce no estado.

Amanda Paixão e Vitória, sua filha (Foto: Arquivo Pessoal)
Apesar de não se arrepender de ser mãe tão jovem, Amanda Paixão, que engravidou do marido pela primeira vez aos 15 anos, destaca as desvantagens de uma gestação precoce. “Não só eu, mas quase todas as meninas que passam por isso, perdem a juventude e são obrigadas a deixar os estudos e a diversão. Apesar disso, não me arrependo do que fiz e hoje sou muito feliz por ter minha filha ao meu lado”. Amanda perdeu o primeiro bebê e engravidou novamente por vontade própria aos 17 anos. Dessa segunda gestação nasceu Vitória, que hoje tem 5 anos. “O apoio e o carinho dos meus pais foram de fundamental importância para que eu seguisse em frente e construísse minha vida”, contou.

Falta de informação ou descuido?

Campanhas nas escolas e na televisão, palestras ou panfletos, o tema é, sem dúvida, bastante abordado. Contudo, por que há tantas adolescentes grávidas ainda? O médico ginecologista hebiatra (medicina do adolescente), Nacélio Parente, destaca a falta de diálogo com os pais e o descuido das adolescentes como os principais causadores dos altos índices de gravidez na adolescência. “Sexualidade ainda é um assunto tabu nos lares brasileiros. É muito comum, encontrar mães que tem receio ou vergonha de tocar no assunto com seus filhos, o que acaba por incentivar a procura de informações fora do contexto familiar”, afirmou Nacélio.
Nacélio Parente (Foto: Verlane Estácio)
Ainda de acordo com ele, por falta de conhecimento ou condições financeiras, muitas meninas têm medo de ir ao ginecologista. “Ainda existe um mito em relação à figura do médico, principalmente se este for um homem. Sem contar que o sistema único de saúde (SUS) ainda não está preparado para orientar e receber estas meninas adequadamente” completou.
Mauricéia de Oliveira, tia de L. M., conta que a sobrinha tinha vergonha de se prevenir. “Perguntei para L. porque ela não tomava comprimido para se prevenir e ela respondeu que tinha vergonha. Ela tinha essa vergonha, pois mora com o pai e a madrasta. Muitas jovens não tomam anticoncepcionais, pois tem medo da mãe ou do pai pegar ela tomando e fazer um escândalo. Eu penso que escândalo, na realidade, é ficar grávida”, argumenta.

Consequências

Devido a condição de dependência da garota para com a família, há sempre o fator pais nessa situação. De que forma os pais aceitarão ou se aceitarão, pois muitas famílias possuem valores tradicionais chegando até mesmo a expulsar as grávidas de casa. E depois encarar ainda os amigos, a escola, os vizinhos, entre outros, gerando assim um estado de vulnerabilidade emocional.
“Quando minha família descobriu minha gravidez foi a maior repercussão, pois nela um sempre se mete na vida do outro. Sofri acusações da minha família. Meu pai começou a me prender, não deixava sair com meu namorado” diz L.M. Já Amanda, enfrentou a situação com mais facilidade, “eu não sofri diretamente preconceito, pois não omiti a gravidez e a todo o momento fui muito verdadeira”.
De acordo com Nacélio Parente, do ponto de vista fisiológico, as adolescentes ainda não completaram seu pleno desenvolvimento. “Úteros, ovários e mamas ainda não atingiram sua formação matura, o que pode causar complicações na gestação a exemplo de abortamento, parto prematuro e eclampsia”, disse o médico. “Também existem a mudança nos aspectos sociais e culturais destas jovens. Parte delas deixam os estudos para cuidar do bebê, trabalhar ou simplesmente por ter vergonha dos amigos”, acrescentou.

Aborto

Monalisa e João Gabriel (Foto: Arquivo Pessoal)
Após a constatação da gravidez, as meninas passam por uma série de sentimentos: surpresa, medo, vergonha, apreensão. E o aborto, frequentemente, surge como opção.  “Gravidez é um fato da vida que faz você pensar em muitas coisas, deixa você sem saber o que fazer, principalmente quando você é jovem. Passou sim nos momentos de desespero a idéia do aborto por não saber o que fazer, como resolver essa situação, mas meu coração não queria que eu fizesse essa escolha porque é uma criança, meu filho”, conta Monalisa Souza, 20 anos, grávida aos 17.
Usado para tratar úlceras no estômago, o medicamento Cytotec é amplamente usado para o aborto. Devido a essas propriedades, o medicamento deixou de ser fabricado, ficando mais escasso no mercado. Dessa forma, cresceu o número de adolescentes que recorrem às clínicas clandestinas e se submetem a perigosos métodos abortivos.
Suzanne Carvalho, psicóloga, define aborto como uma experiência traumática. “Mesmo a mulher naquele momento tendo escolhido não querer estar grávida, é uma decisão muito complexa e é um procedimento muito invasivo que deixa sequelas físicas e psicológicas. Muitas pessoas abortam na adolescência, mas no futuro quando estão maduros se arrependem, pois tem percepção das coisas e percebem que podiam ter criado o filho”, expõe.

Prevenção

Além dos métodos contraceptivos já conhecidos (confira na tabela abaixo) e das campanhas publicitárias, dois fatores se apresentam com importância fundamental para a prevenção desse problema.
 Primeiro, o incentivo do diálogo entre pais e filhos. “A melhor forma de prevenção da gravidez na adolescência é a educação familiar. Deve haver um maior diálogo entre pais e filhos, pois hoje em dia, muitos se preocupam em trabalhar e dar os bens materiais, esquecendo da conversa e da amizade entre pais e filhos”, explica o hebiatra, Nacélio.
Ana Carolina Miranda (Foto: Tatianne Melo)
Segundo, a atuação do poder público, através dos programas de prevenção. “Mesmo com as estratégias de prevenção desenvolvidas nos postos de saúde, sentimos que em muitos bairros os índices de gravidez continuam altos. No entanto, contamos com o Programa Saúde na Escola (PSE), instituído nacionalmente a partir de uma parceria entre os Ministérios da Educação e da Saúde, atua nas instituições de ensino de Aracaju desde o ano de 2008. Com o apoio da Secretaria Municipal da Educação (Semed), parte do programa está voltada para educação de estudantes e prevenção ás DSTs, uso de drogas e gravidez juvenil”, contou a coordenadora do Programa Saúde da Mulher da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Ana Carolina Miranda.
Arte: Tatianne Melo

          A seguir, segue o link da primeira parte do documentário "Meninas" de Sandra Werneck. A cineastra dar voz a quatro adolescentes cariocas grávidas que guiam o documentário com os  sentimentos e pensamentos de alguém que está pulando boa parte da infância. As outras partes do documentário estão visíveis no link. Confiram! 



Reportagem: Adler Berbert, Tatianne Melo e Verlane Estácio 




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