Salários abaixo da média e estrutura em necessidade de renovação são os principais problemas enfrentados pela Sinfônica de Sergipe atualmente.
Abertura da temporada 2013 da ORSSE (Foto: Fabiana Costa) |
Criada na década de 80, mas só tendo caído no gosto público nos últimos anos, a Orquestra Sinfônica de Sergipe, apesar de não aparentar, ainda possui muitos problemas e disfunções estruturais que necessitam ser solucionados. A precariedade do salário dos músicos, o estado dos instrumentos e a falta de investimento necessário são questões que colocam em risco a permanência da ORSSE no cenário musical sergipano a longo prazo. Contudo, as temporadas continuam a encantar e divertir o público, e a de 2013, que começou com o lançamento do CD da Orquestra, trará grandes nomes da música clássica para o Estado.
Para o maestro Guilherme Mannis, é preciso um maior investimento na Orquestra, principalmente no que diz respeito à remuneração. "Os salários de nossos músicos estão muito defasados frente a grupos análogos no Brasil, mesmo comparando-se a orquestras fora do eixo RJ-SP-BH. A composição salarial urge, para motivar e dignificar nossos profissionais, combater a evasão de músicos e recompor nossos quadros", afirma. O professor de música da Universidade Federal de Sergipe, João Liberato, afirma que o problema dos baixos salários precisa ser solucionado o quanto antes. "Se o intuito é fazer uma boa orquestra esta é uma questão que precisa ser resolvida, pois os músicos de melhor qualidade técnica acabam saindo da ORSSE e migrando para instituições que pagam melhor".
Um músico que não quis se identificar afirmou que a ORSSE é uma das orquestras de menor remuneração no país. "Se compararmos a ORSSE com as orquestras que pagam melhor no Brasil, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo e a Orquestra Sinfônica Brasileira, a diferença ultrapassa os 400%, mas mesmo assim, se a compararmos com qualquer outra orquestra sinfônica profissional do Brasil, a diferença é sempre superior a 100%", e ainda completou "Todos os anos perdemos excelentes músicos para outras orquestras profissionais. Eles vão em busca de orquestras que ofereçam salários melhores. E o maior problema é que não existem mais músicos querendo vir para cá. A orquestra perde ótimos músicos, e suas vagas não são mais preenchidas. Tivemos testes para preencher as vagas que estavam em aberto e, para algumas vagas, não houve nenhum candidato inscrito. O salário não está mais atraindo ninguém".
Um dos músicos que largou a Orquestra no mês passado por motivos salariais foi o violista Cleverson Cremer. "A diferença de salario é muito grande, pois vou ganhar mais que o dobro que ganho aqui", explica e completa "A saída de músicos da orquestra é frequente. Todo o ano sai um ou dois, pelo menos e o motivo, na maioria das vezes, é o salário".
Maestro Mannis (Foto: Site da ORSSE) |
Estrutura e financiamento
Outra questão problemática abordada pelo Maestro Mannis é a estrutura. "É necessário ainda um grande investimento em infra-estrutura, em instalações e instrumentos, sobretudo os de percussão. Maior investimento artístico também é necessário, para que o público seja brindado com espetáculos de maior grandeza e qualidade. Sergipe precisa receber óperas, tem público e teatro para isso".
O mesmo músico que não quis se identificar conta que gasta uma grande quantia do seu salário com a manutenção do seu próprio instrumento. "Existem os instrumentos que pertencem aos integrantes da orquestra, e os instrumentos que são propriedade da Orquestra Sinfônica de Sergipe. Eu mesmo sou proprietário do instrumento que uso, e tenho que arcar com os custos de manutenção, que não são nada baratos. Com o salário que ganhamos fica muito difícil fazer a manutenção regular que os instrumentos precisam, o que prejudica o nosso desempenho no trabalho. Os instrumentos que pertencem à Orquestra, como os instrumentos de percussão, pianos, também estão precisando de manutenção, e a orquestra também precisa urgentemente adquirir outros instrumentos, como o corne-inglês".
A Secretaria de Estado da Cultura, responsável pela Orquestra, mostrou-se aberta às críticas e disposta a solucionar as questões e afirmou em nota ao Contexto: "A assessoria de comunicação da Secretaria de Estado da Cultura (Secult) informa que a instituição reconhece que é necessária uma reestruturação da Orquestra Sinfônica de Sergipe e, por isso, a atual gestão está em busca de recursos para promover melhorias salariais para os músicos e renovar os instrumentos utilizados pelos mesmos nas apresentações".
Nesse ano de 2013, a ORSSE foi contemplada com o selo da Lei Rouanet. Essa lei, chamada de Lei de Incentivo à Cultura, instituída em 23 de dezembro de 1991, concede incentivos fiscais a pessoas físicas e jurídicas que invistam na cultura. A Rouanet pode vir a solucionar alguns dos atuais problemas encontrados na Orquestra. "A Lei possibilitará, com um bom departamento de marketing e caso sejam captados bons recursos através do mecanismo, que o grupo consiga ter melhorias, sobretudo na área de infraestrutura e área artística. Mas, antes de tudo, é necessário captar: é necessário que o empresariado se solidarize à causa da sinfônica, e que efetivamente as possibilidades de captação se transformem em recursos e consequentemente em benefícios. Tarefa muito difícil, mas que pretendemos vencer", explica o Maestro Guilherme Mannis.
O exemplo da Osesp
Considerada como melhor orquestra da América Latina, a Sinfônica de São Paulo também já enfrentou muitas dificuldades. Em depoimento à revista Época, Evelyn Levy, consultora em gestão pública do Banco Mundial, contou que, em meados da década passada, os músicos da Osesp encontravam-se em situações precárias em que precisam, por exemplo, botar suas partituras no chão, pois não possuíam armário e que ficaram nove meses sem elevador devido a demoras na licitação.
A solução para os problemas da Osesp se deu com a adoção do modelo de Organizações Sociais (OSs), que fez com que ela passasse a ser gerida como empresa privada. A primeira edição de abril da Revista Época explicou que atualmente apenas 64% do orçamento vem do governo, enquanto o resto vem de patrocínios, doações e projetos incentivados, além de das verbas obtidas com as vendas de ingressos e locação de espaços. Em sua maioria, as OSs são fundações ligadas a escolas públicas ou privadas, entidades filantrópicas e associações de amigos. Para Mannis, esse tipo de gestão seria o ideal para a ORSSE.
Temporada de 2013
Apesar dos problemas, as apresentações da ORSSE continuam a entreter e divertir o público. A temporada desse ano contará com 24 concertos, distribuídos em apresentações das séries ‘Cajueiros’ e ‘Mangabeiras’, no Teatro Tobias Barreto; ‘Laranjeiras’, no Teatro Atheneu; ‘Sons da Catedral’, na Catedral Metropolitana de Aracaju; e ‘Orquestra na Estrada’, que passará por municípios como São Cristóvão, Laranjeiras, Lagarto, Estância e Itabaiana. A estreia da nova temporada aconteceu no dia 13 de março e os concertos ocorrem, normalmente, a cada 15 dias. A programação completa está disponível através do link.
Mannis acredita que uma orquestra precisa se reinventar a cada temporada e é o que eles têm tentando fazer. "Considero 2013 um ano chave, e para isso bolamos uma temporada que tem inúmeras boas características: ousadia, diálogo com a contemporaneidade, diálogo com a comunidade musical local, privilégio à música brasileira. Nosso objetivo é o de que nosso público mantenha um interesse crescente por sua orquestra, e mudar é sempre necessário". Ele também afirma que a temporada do ano anterior foi de ganhos incontestáveis. "O trabalho orquestral sempre deve ser visto a longo prazo, e o que podemos ver é uma orquestra cada vez mais madura e reconhecida pelo seu público e pela sociedade musical brasileira", finaliza.
Gabriela de la Vega
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